Ex-secretário nacional de segurança pública, o antropólogo Luiz Eduardo Soares argumenta que “não é razoável continuar discutindo segurança com foco exclusivamente na criminalidade e em organizações criminosas”.
Glauber, heroísmo e refundação da política
Para o site Outras Palavras, 22/04/2025
Vida institucional brasileira rasteja, aferrada à mercantilização, incapaz de se inspirar em quem tentou dar-lhe vitalidade, grandeza e viés solidarista. Por isso precisamos de quem, como o deputado, entrega o próprio corpo à luta coletiva
No ano 2000, publiquei um artigo no site No, sob o título “Perdão e esquecimento: a cultura política brasileira e as lições da África do Sul”i, onde procurava mostrar que a subordinação da política ao mercado corroía a credibilidade das instituições democráticas e poderia abrir, perigosamente, espaço para a reemergência do autoritarismo, se forças conservadoras identificassem a profundidade da rejeição popular à cultura política liberal e oferecessem um blend ideológico de ordem e mudança. O artigo afirmava a negligenciada importância do heroísmo – entendido como o sacrifício dos próprios interesses, quando não da própria vida –, como fonte de valor e legitimidade da política, talvez a única força moral e afetiva capaz de reverter a hegemonia degradante da mercantilização generalizada.
Reproduzo, aqui, sinteticamente, o artigo escrito há 25 anos, em homenagem ao gesto de um político que honra o instituto da representação. Durante dez dias, o deputado federal Glauber Braga, ameaçado de perder o mandato por se opor ao jogo das emendas secretas, esteve em greve de fome. Decidiu pôr sua vida em risco em resposta ao absurdo. Sua decisão causou surpresa e perplexidade. Havíamos esquecido que política não se restringe à lógica liberal, utilitária e individualista. Para evocar virtudes heróicas na política, não é preciso recorrer às armas. Basta apagar a fronteira entre privado e público, não para tornar a sociedade voyeur de intimidades narcísicas, mas para entregar o próprio corpo à luta política coletiva.
Leia Mais...»Genocídio negro: o STF agirá?
Para o Site – Outras Palavras – Publicado 23/03/2025
“Aboliremos a escravidão, desde que…”, diziam os oligarcas no Império. A mesma lenga-lenga cerca agora a ADPF-635, que interromperá, se aprovada, as operações policiais mortíferas nas favelas e periferias. O Supremo se atreverá a acolhê-la?
Nesse domingo, 23 de março, na Folha de SP e no Globo, ótimo artigo de Elio Gaspari compara as resistências ao projeto de lei do governo federal que busca tornar menos injusto o Imposto de Renda às evasivas dos anti-abolicionistas, no século XIX, que se diziam de acordo com o fim da escravidão, “desde que”… Havia sempre um “desde que”, exigindo reparações aos proprietários penalizados com a perda de seus ganhos e alertando para riscos de desorganização da economia, instabilidade jurídica e desordem pública. Enquanto lia o catálogo da infâmia escravagista, pensava na população vulnerabilizada do Rio de Janeiro e nos inumeráveis “desde que” ainda em voga, mobilizados diariamente por políticos e policiais para postergar mudanças urgentes na segurança pública. Contra a ADPF 635, que o STF se prepara para votar, evocam o “desde que” sem pruridos, sacrificando a razão, as evidências e qualquer veleidade de honestidade intelectual.
Notas sobre um cenário em desarranjo
Para o site Outras Palavras – 18/02/25
Quanto mais segue a cartilha neoliberal, mais Lula se enfraquece e amplia os riscos de derrota em 2026. O diálogo pode ser um primeiro antídoto. Governo deve expor quem bloqueia as mudanças. E o conjunto da esquerda pode servir-se da palavra para escapar de três tendências desastrosas
Difícil escapar dos temas que nos angustiam, sobretudo quando nos desafiam tanto intelectual quanto politicamente. Em retrospecto, parece que foi mais fácil compreender o golpe de 1964 e a transição democrática -com suas virtudes, seus limites, suas contradições- do que os revezes que precipitaram o impeachment golpista de Dilma Rousseff, marcando a ruptura do pacto celebrado em 1988, e culminaram com a ascensão do neofascismo bolsonarista -derrotado por um triz, em 2022, mas ainda um espectro no horizonte a nos assombrar, sobretudo após a vitória de Trump. Mais fácil compreender talvez porque o contemporâneo seja sempre mais desafiador, ou talvez porque nossas categorias estivessem mais ajustadas àquele mundo. O fato é que o quadro geopolítico é dramaticamente complexo, especialmente depois do genocídio em Gaza.
Crânios de vidros
Por LETÍCIA NÚÑEZ ALMEIDA*
Considerações sobre o livro recém-lançado de Luiz Eduardo Soares O que é a realidade? Nós a produzimos ou somos produzidos por ela? A verdade é sempre relativa? Quais as fronteiras entre o consciente e o inconsciente? Existe uma (in)consciência coletiva? O novo livro de Luiz Eduardo Soares é a antítese de São Tomé, não é recomendado aos que só acreditam no que podem ver, tocar, ler. É o(a) leitor(a) no meio da tempestade elétrica da encruzilhada desenhada pelo autor.
É urgente retomar a esperança
Premido pela onda obscurantista e pela crise internacional, o governo Lula ruma para o colapso
VÁRIOS AUTORES (nomes ao final do texto)
Agindo de forma reativa, enlaçado pela corrupção parlamentar, premido pela onda obscurantista e pela crise internacional, o governo Lula ruma para o colapso. Cabe reagir sem demora.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante cerimônia em Brasília em janeiro deste ano – Ueslei Marcelino/Reuters
Eleito pela mobilização contra a extrema direita, Lula não exibiu proposições claras e consistentes na campanha. Prometeu extinguir o teto de gastos, incluir o pobre no orçamento, rever a reforma trabalhista, valorizar o serviço público, garantir gasolina barata, reestatizar a Eletrobras e botar picanha e cerveja na mesa do povo.
No governo, prendeu-se ao fiscalismo ao gosto dos banqueiros. Estabeleceu meta de inflação inalcançável, argumento para o Banco Central elevar a taxa de juros. Essa camisa de força inviabiliza o bom serviço público, inibe investimentos produtivos e o atendimento aos mais pobres.
Crescimento do PIB, do emprego e da renda não bastam à sociedade. O corte de gastos resultante da obsessão fiscal fomenta a desesperança.
O preço da comida, a insegurança pública, a dificuldade de locomoção e a carência de moradia frustram as expectativas do povo.
Leia Mais...»LANÇAMENTO: CRÂNIO DE VIDRO DO SELVAGEM DIGITAL 💀
Do mesmo autor de Elite da Tropa e Cabeça de Porco, o novo livro de Luiz Eduardo Soares, aposta na liberdade da imaginação através de uma narrativa surpreendente, aceitando o desafio de transformar em literatura o esgotamento sem fim de um mundo em ruínas.
O bate-papo com o autor, será mediado por Suzana Vargas, escritora, professora de literatura, diretora do Instituto Estação das Letras e curadora de projetos culturais, como o Clube de Leitura do Centro Cultural do Brasil.
E segue com a sessão de autógrafos.
Então anota na sua agenda, dia 18 de dezembro, a partir das 19 horas, na Blooks Livraria (Praia de Botafogo, 316 – Botafogo, Rio de Janeiro/RJ)
A verdade veio à tona, no córrego sob a ponte
Publicado 06/12/2024 no site Outras Palavras
Arremesso de um jovem escancara a realidade da violência policial: um gesto asséptico – descarte de uma vida descartável, sem a habitual coreografia da brutalidade. Após incentivar os banhos de sangue da PM, Tarcísio admite erros: uma harmonização facial na máscara fascista
Policial militar de São Paulo arremessou um jovem da ponte. Mais um ato criminoso de brutalidade da corporação comandada por Tarcisio-Derrite? Não. O impacto na opinião pública demonstra que houve aí algo diferente. Tão diferente que jogou o governador do alto de sua arrogância no chão da oficina de reparos de imagem, onde calçou as sandálias da humildade e admitiu erros.
Leia Mais...»O dragão na sala de visitas: democracia, defesa e segurança pública
29 de novembro de 2024 para o Portal Grabois
A maior parte da opinião pública politizada que se identifica com o campo progressista e democrático talvez ainda não tenha compreendido a natureza institucional dos problemas graves de insegurança que vivemos no país. O fato é que convivemos há tanto tempo com um dragão adormecido na sala de visitas, que nos acostumamos a falar baixo e contorná-lo para evitar que desperte e faça sabe-se lá o quê. Não é confortável, mas muitas coisas na vida tampouco o são, mesmo assim aprendemos a normalizá-las. O dragão entre nós são os enclaves institucionais representados pelas Forças Armadas e pelas polícias. Enclaves porque, embora essas corporações e os limites de sua atuação estejam estabelecidos na Constituição, elas têm se mostrado refratárias à autoridade civil e política, e portanto às determinações constitucionais.
Fim da escala 6×1 e atentados bolsonaristas: mais uma chance para o Brasil
Publicado em 23/11/2024 no Blog Boitempo
A obra prima de Carlos Drummond de Andrade “A Máquina do Mundo” descreve o momento extremo em que se decide o destino da relação entre o sujeito e a verdade, a consciência e a história, a potência humana e seu limite, o desejo e a finitude, a ação e a inércia, a ousadia arriscada e a indiferença estéril. Momento precioso e fugaz em que o mundo se abre ao caminhante e lhe oferece a oportunidade de colher o segredo de seu mistério.
Leia Mais...»Luiz Eduardo Soares e Manuel Domingos Neto: Reunião atrasada, mas necessária
03/11/2024 para o site VIOMUNDO
Por Luiz Eduardo Soares e Manuel Domingos Neto*
Na quinta-feira passada (31.10.2024), deu-se uma reunião marcada há 21 anos.
A convite de Lula, governadores e o ministro da Justiça encontraram-se no Planalto para discutir a Segurança Pública.
Essa reunião foi agendada e postergada, depois cancelada, no início do primeiro mandato de Lula, em 2003. O atraso de 21 anos diz muito sobre as dificuldades de enfrentar o problema.
Em 2001, Lula presidia o Instituto Cidadania e era pré-candidato a presidente. Um grupo de trabalho formulou, então, seu programa de Segurança Pública.
Profissionais de origens, experiências e perspectivas variadas debateram em audiências públicas, visitas e seminários. A proposição resultante foi entregue por Lula às casas congressuais e ao ministro da Justiça em 27 de fevereiro de 2002.
No ambiente ouriçado de hoje, é difícil imaginar que o então líder da oposição ao governo FHC fosse respeitosamente recebido por dirigentes da situação, todos valorizando a qualidade da proposta.
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