Facebook, 4 de maio, 2020
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A situação é delicada e grave. O QG de Bolsonaro não elabora estratégias, mas táticas de ação, as quais, por serem estreitas quanto à consideração do ambiente (econômico, social, cultural, intersubjetivo e político) e imediatistas, nos dão a impressão de serem exclusivamente reativas, hesitantes e trôpegas, como o caminhar claudicante de um soldado embriagado. Entretanto, os reativos temos sido nós. Ontem, domingo, o presidente nos propôs o “chicken game” -aquele desafio em que dois carros partem a toda velocidade um em direção ao outro até que um motorista desvie, demonstrando medo, salvando a ambos e dando a vitória a seu competidor. Se os dois forem “machos”, morrem abraçados às ferragens, nas chamas de sua patética e ensandecida virilidade.
Ontem, Bolsonaro nos ameaçou com o chicken game e, ato contínuo, piscou. Primeiro, disse: “Acabou… Não vou mais aceitar interferências… Vou fazer o que tem de ser feito…” Mas depois completou: “Tenho o apoio das Forças Armadas e do povo…” Se tivesse, não diria, se quisesse jogar o chicken game de verdade, disposto a vencer, isto é, a dar o golpe, não proporia o jogo, não ameaçaria, muito menos evocaria apoios que apenas revelam sua necessidade de apoio, ou seja, sua fraqueza, seu crescente isolamento. Foi uma espécie de ato falho político, um lapso que expõe seu ódio impotente. Ele acusou o golpe, ironia das ironias. Certamente, sabe o que Moro revelou na véspera, em Curitiba, e sabe aonde chegaram as investigações sobre fakenews e sobre a organização dos atos. Sabe que seus dias estão contados.
Se isso é boa notícia, por outro lado, sugere que corremos riscos muito sérios. Acuada, sem alternativas, a fera ataca. Só lhe resta dobrar a aposta no caos: bater nos governadores, jogar gasolina na fogueira da pandemia, retardar a distribuição do auxílio a quem tem fome e, se o caos em que investe demorar a vir, liberar a brigada patriótica Jair Bolsonaro para agir. Como? Simples. Atacar uma grande liderança popular, uma segunda Marielle, seria um erro, pois deixaria evidente de que lado vem a violência e geraria empatia com a vítima, debilitando politicamente o governo. Mas incapacitar um ministro do Supremo poderia funcionar, desde que se atribuísse a ação à esquerda -um segundo Plano Cohen já deve ter sido fabricado pelo general Heleno-, criando condições para que Bolsonaro reivindicasse a decretação de Estado de Sítio.
Será esta especulação excessivamente pessimista e fantasiosa? Talvez, mas o que sabemos sobre milícias, grupos de ódio se armando e bolsonaristas revivendo o integralismo nos autoriza a temer o pior. E temer o pior parece sensato, até para evitar o pior. Antes de terminar, uma nota jocosa: os integralistas eram chamados de galinhas verdes.