Pirata do Caribe
Autor de “Elite da Tropa”, Luiz Eduardo Soares lança livro sobre brasileiro preso por ligação com tráfico de duas toneladas de cocaína da Colômbia para o Reino Unido
MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DO RIO – ILUSTRADA
FOLHA DE S.PAULO
Economista brasileiro é preso em Londres por associação ao tráfico de duas toneladas de cocaína. É julgado por 14 meses e condenado a 24 anos de cadeia. O caso é amplamente noticiado pela imprensa britânica.
Trama uma fuga mirabolante, é descoberto, classificado com o máximo de periculosidade e enviado para a solitária em prisão de segurança máxima. Cumpre sete anos, até ser transferido para um presídio no Brasil.
Imagine-se o estardalhaço que essa narrativa, iniciada em 1999, causaria se acontecesse hoje. E, no entanto, tão surpreendente quanto a vida de Ronald Soares, 61, o sujeito de quem se fala acima, é o fato de sua história ter sido praticamente ignorada aqui.
Ao menos até agora, quando sai “Tudo ou Nada”, livro do antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário nacional de Segurança Pública do governo Lula e um dos autores de “Elite da Tropa” 1 e 2, que deram origem aos dois filmes “Tropa de Elite”.
Os Soares, que não são parentes, se conheceram em 2007, quando Ronald estava no regime semiaberto, no Rio -sua pena seria extinta em 2010, após cumprir metade dela.
Um primo o colocou em contato com Luiz Eduardo porque Ronald tinha vontade de contar sua história. Tentara escrever na solitária inglesa, mas lhe tomavam todos os escritos. Também não se julgava bom autor, daí buscar um profissional.
“Achei que, colocando a história de forma clara, poderia ajudar quem pensasse em trilhar o caminho que eu trilhei. Porque, na hora em que você está fazendo, não está pensando. Você entra num outro mundo”, diz o protagonista à Folha, em entrevista na casa do autor, no Rio.
“Seria uma recompensa boa, moralmente, se eu pudesse de alguma maneira fazer um bem, ajudar a pessoa a pensar antes de agir.”
Ao longo de quatro anos de conversas, Luiz Eduardo percebeu que tinha em mãos uma história “extraordinária, no limite do inverossímil”.
Ronald lhe falou sobre os métodos cinematográficos para levar a cocaína da Colômbia ao Reino Unido, com escala no Caribe -e que incluíam reuniões na selva com o cartel de Cali, aviões jogando caixas em alto-mar, iates camuflados resgatando-as.
Descreveu também a organização metódica, os personagens misteriosos, a longa experiência nas diferentes prisões. Abriu sua vida privada, falou do vício em heroína que o levou ao tráfico.
Com isso, a narrativa de “Tudo ou Nada” vai mudando de tom e de ritmo. Passa de livro de espionagem a memórias do cárcere, ora é drama pessoal, ora tem romance, ação e comédia.
“O que me interessava como escritor, não como cientista social, era construir uma narrativa que pudesse gerar uma empatia com os leitores de modo que eles mergulhassem com Ronald nesses abismos, para viver essas aventuras e desventuras sem julgamento”, diz Luiz Eduardo.