Enquanto Anoitece
Enquanto Anoitece
Aos vinte anos, em 1955, Raimundo Nonato, trabalhador rural e órfão de pai, mata o violador de sua irmã. Conduzido pelos capangas do patrão à Casa-Grande para ouvir a sentença, acaba incorporado à milícia do Engenho. Em 1973, jagunço experiente, austero e disciplinado, é constrangido a levar a tropa do exército à casa de uma beata, sua madrinha, onde um guerrilheiro comunista estaria escondido. A lealdade à velha senhora é mais forte que o dever. O fugitivo escapa. Raimundo é preso e torturado em seu lugar, mas a vida lhe é poupada graças à clemência do patrão, aliado aos militares. O preço a pagar é a expulsão do Engenho, de onde a mãe e a irmã já haviam sumido. Adestrado para as armas e o autodomínio, Raimundo torna-se pistoleiro a soldo. Um profissional com escrúpulos e princípios. Cumprida a primeira missão, transportando o corpo na mala do carro que recebe em pagamento pela tarefa, vê-se ante o inesperado: na estrada que é desolação e aridez, ao lado de uma kombi vencida pelo barro, uma mulher acena. Não há como lhe recusar carona, mesmo ao descobrir que se trata de um casal. Logo se saberá que ela transporta maconha e dólares e ele é o militante procurado. Seguem, assim, estrada a fora, o pistoleiro desidratado e febril que oculta um cadáver, a traficante e o comunista. Os desdobramentos desse encontro atravessarão o país, conduzindo
Raimundo ao Rio de Janeiro, em 1985, com a mulher, o filho, e a decisão de mudar de vida. Vinte anos depois, porteiro e morador da favela, o protagonista passa da alegria ao terror, quando o filho, seu orgulho, aprovado no vestibular de medicina, desaparece. A conflagração do presente condena o protagonista a um reencontro dramático com o passado, assim como o país, que avança agarrado à sua história brutal.
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2066
Romance 2066, de Luiz Eduardo Soares e Rafael Coutinho:
O cataclismo ambiental aqueceu a temperatura no Rio de Janeiro às raias do
insuportável, gerou escassez de água, reduziu drasticamente a população,
redesenhou o litoral e redefiniu a cartografia da cidade. Os cartões postais
continuam lindos, em 2066, mas nada têm a ver com as imagens que admiramos até
hoje. Nesse cenário, o romance conta a história de padre Sergio, que exerce o
sacerdócio na semi-clandestinidade, e sua irmã Samara, oficial da polícia médica. A
morte do pai, velho general, os reaproximou. Os irmãos reencontrarão o passado
familiar, que lhes pesará como um legado aterrorizante, quando Samara leva Maria
da Graça, a jornalista pela qual se apaixonara, a um passeio na Serra.
Outra herança, entretanto, se revelará luminosa, aquela que provém de
obscura linhagem romena, cuja origem remonta à rebelião dos castrati, meninos
castrados para cantar com vozes femininas, muitos séculos antes. Gerações
sucessivas sobreviveram graças a insights sobre o futuro, alcançados sob a forma de
visões proféticas, suscitadas em rituais bastante peculiares, que exigem a cópula
entre um homem casto da família e sua parente, depositária das tradições
espirituais. Ao filho dessa mulher será concedido o momento de iluminação. A
previsão anterior apontava para o Rio de Janeiro.
A única oposição ao governo é exercida pelo movimento hacker-anarquista,
cuja ala moderada Sergio lidera. Circunstâncias e investigações o levam a identificar
o segredo da estratégia dos poderes transnacionais, causadores de prostração
psíquica e servidão voluntária: a fórmula estética -a estrutura formal, não os
conteúdos- que organiza roteiros e narrativas, difundidos por todos os meios de
comunicação. A descoberta mobiliza a resistência e promove a crise do regime.
Após a realização do ritual erótico-esotérico, sob a direção de representante
da antiga estirpe, Sergio e Samara encontrarão a utopia, onde jamais a poderiam
imaginar. A tarefa agora é anunciar a boa nova, sem dizer de que se trata,
exatamente, e onde ela está sendo experimentada, o que colocaria em risco sua
existência. O movimento anarquista se divide, espelhando a cisão no governo, e o
confronto se radicaliza.
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Vidas Presentes
Vidas Presentes
Durante três anos, setenta articuladores sociais percorreram os bairros da cidade do Rio de Janeiro com o objetivo de localizar crianças e adolescentes, com idade de 6 a 14 anos, que estivessem fora da escola ou com risco de evasão escolar.
Nesta busca, identificaram mais de 23 mil crianças que haviam abandonado ou nunca chegaram a frequentar a escola. Destas, mais de 22 mil voltaram a estudar ou se matricularam na escola pela primeira vez.
O livro é baseado no relato das articuladoras e articuladores locais responsáveis pela Busca Ativa e pelo contato com as famílias
Os números demonstram o sucesso da metodologia desenvolvida pelo Projeto Aluno Presente, uma iniciativa da Associação Cidade Escola Aprendiz em parceria com a Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro (SME/RJ) e com apoio da Fundação Education Above All (Qatar) por meio do programa internacional Educate a Child.
Mas para além dos números encontramos histórias. São elas que valem cada esforço desempenhado. E são elas que dão corpo ao livro Vidas Presentes, que conta com a narrativa do antropólogo e escritor Luiz Eduardo Soares e do olhar do gravurista Francisco Maringelli.
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Dentro da noite feroz: O fascismo no Brasil
Dentro da noite feroz: O fascismo no Brasil
Neste ensaio inédito, o antropólogo Luiz Eduardo Soares apresenta uma aproximação entre o bolsonarismo (entendido como o conjunto de discursos e práticas de Bolsonaro e de seus apoiadores) e o fascismo. Abordando as principais características do que seria um regime fascista e de que forma ele se aplica à realidade brasileira, o autor demonstra, utilizando-se de falas, manifestos e ações, a proximidade escancarada do governo Bolsonaro e seus apoiadores ao fascismo, em especial sua versão brasileira, o integralismo, criado na década de 1930. Escrito às vésperas de ser incluído em dossiê produzido pelo Ministério da Justiça contra funcionários públicos, policiais e formadores de opinião antifascistas, Soares desdobra os acontecimentos relativos a Bolsonaro desde a campanha de 2018, passando por uma análise do lavajatismo no Brasil, o assassinato de Marielle Franco, a intrínseca relação de Jair Bolsonaro e sua família com as milícias do Rio de Janeiro, a atuação de religiosos fundamentalistas e uma suposta volta do Brasil à ordem e aos chamados valores familiares tradicionais. De acordo com o autor, “a virilidade teatralizada na campanha e no governo de Bolsonaro, estendendo 28 anos de vida pública absolutamente coerentes e transparentes, nesse aspecto, seria posta de volta em seu lugar ‘original e eterno’, reafirmando a supremacia do macho, a superioridade da família tradicional, a regência exclusiva dos valores ditos verdadeiros, essenciais, naturais: esse é o apelo e a promessa implicada no bolsonarismo”. Arte da capa por Heleni Andrade.
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O Brasil e seu duplo
O Brasil e seu duplo
Quando Lula foi preso, em 2018, abrindo caminho para o triunfo eleitoral de Bolsonaro, o país mudou: desfez-se o consenso em torno do pacto constitucional, de natureza social-democrata. Desde então, afirmou-se uma direita radical que se contrapõe aos liberais e às esquerdas não só em matéria de prioridades e políticas públicas, mas também no plano ideológico. Como chegamos a essa situação? Quais seus pressupostos históricos e estruturais? Este livro enfrenta essas perguntas com brilhantismo e sagacidade.
título: O BRASIL E SEU DUPLO
isbn: 9786580309566
idioma: Português
encadernação: Brochura
formato: 13,5 x 20,7 x 1,7
páginas: 272
ano de edição: 2019
ano copyright: 2019
Desmilitarizar
Segurança pública tem sido tema recorrente na agenda pública, mas sua transformação profunda nunca esteve em cogitação. Em Desmilitarizar: segurança pública e direitos humanos, o antropólogo Luiz Eduardo Soares coloca em questão as razões para o imobilismo brasileiro em face da questão da violência. A partir do entendimento dos problemas diagnosticados tanto na esfera pública quanto na privada, o autor oferece propostas e orientações claras para superá-los.
Os quatorze ensaios aqui reunidos estão estruturados em quatro pilares temáticos: polícia, drogas, raízes da violência e direitos humanos. Somados à introdução e ao posfácio, formam um conjunto coeso que demonstra que a problemática da violência letal, inclusive a praticada pelo Estado, é decisiva para a reconstrução democrática e o combate ao racismo, aos preconceitos e às desigualdades. Não ficam de fora análises sobre as contraditórias UPPs, a guerra às drogas, a intervenção militar no Rio de Janeiro, o pacote anticrime do ministro Sérgio Moro e sobre relações entre o poder público e o crime organizado. E o livro conta ainda com um Glossário sobre segurança pública.
Desmilitarizar vai além de uma reportagem jornalística ou mesmo da pesquisa acadêmica, seu maior objetivo é provocar mudanças em como encaramos a segurança pública no Brasil. Trazendo sua experiência como secretário Nacional de Segurança Pública, subsecretário de Segurança e coordenador de Segurança, Justiça e Cidadania do Estado do Rio de Janeiro, Luiz Eduardo Soares dirige-se não só a especialistas, mas também a ativistas, movimentos sociais, sindicatos e associações de policiais.
- autor: Luiz Eduardo Soares
- apresentação: Marcelo Freixo
- orelha: Julita Lemgruber
- quarta capa: Paulo Sérgio Pinheiro
- selo:BOITEMPO EDITORIAL
- páginas:296
- formato:16cm x 23cm x 1cm
- peso:478 gr
- ano de publicação:2019
- encadernação:Brochura
- ISBN:9788575596968
Rio de Janeiro: Histórias de vida e morte

Capas dos livros publicadas no Brasil, Itália e Inglaterra
Formato: Livro
Autor: SOARES, LUIZ EDUARDO
Editora: COMPANHIA DAS LETRAS
Assunto: BIOGRAFIAS/AUTOBIOGRAFIAS/DIÁRIOS/MEMÓRIAS/CARTAS
O antropólogo Luiz Eduardo Soares, autor do livro que inspirou o filme Tropa de elite, conhece o Rio de Janeiro como poucos. Pesquisador de renome e ex-integrante da área de segurança pública dos governos estadual e federal, convive há décadas com as mazelas da cidade: o tráfico de drogas, a corrupção policial, a violência.
Este livro é resultado dessa experiência singular. Escrito com mão leve, ritmo de thriller e faro jornalístico, Rio de Janeiro é um retrato impactante sobre as desigualdades, o racismo, a degradação da política, a violência do Estado e o ódio que se derrama sobre a cidade, colocando em risco a beleza exuberante do eterno cartão-postal do Brasil.
Tudo ou Nada
Formato: Livro
Autor: SOARES, LUIZ EDUARDO
Editora: NOVA FRONTEIRA
Assunto: BIOGRAFIAS/AUTOBIOGRAFIAS/DIÁRIOS/MEMÓRIAS/CARTAS
Um avião decola com dezenas de caixas de cigarro, pesando 25 quilos cada uma, e as lança em alto mar, onde são recuperadas por pequenas embarcações e levadas a alguma ilha do Caribe. De lá seguem num veleiro, acima de qualquer suspeita, para Londres. Segundo o autor, é desta forma que toneladas de cocaína são transportadas da selva colombiana até a Inglaterra. Luiz Eduardo Soares se propõe a descrever os bastidores dessa trama, ao relatar a história de um brasileiro que foi preso em Londres com 2 toneladas de cocaína e condenado a 24 anos de prisão por associação ao tráfico internacional de drogas.
Justiça
Formato: Livro
Autor: SOARES, LUIZ EDUARDO
Editora: NOVA FRONTEIRA
Assunto: CIÊNCIAS SOCIAIS – SOCIOLOGIA
“BANDIDO BOM É BANDIDO MORTO. Quem já não ouviu esta frase? A partir de uma emocionante conversa com um motorista de táxi, chocado com o assassinato de um colega durante um assalto, o antropólogo e cientista político Luiz Eduardo Soares desfaz uma a uma as certezas do senso comum neste desconcertante livro. O que é exatamente violência, esta palavra tão repetida no dia a dia? Existe relação entre o crime cometido e o castigo recebido? A defesa dos direitos humanos seria um estímulo à impunidade? Com a argúcia de um filósofo e a experiência de quem conhece o universo criminal de perto, o autor vai até o âmago da questão. E mostra que o sentido de uma história depende sempre do ponto a partir do qual começamos a contá-la. Ao ampliar o foco da questão da violência, deixa claro que Justiça não se reduz a punição. Para Luiz Eduardo Soares, Justiça é sinônimo de equidade. Por isso, uma das formas mais repulsivas de desigualdade social estaria exatamente no acesso a ela, da abordagem policial — que varia de acordo com o local, a roupa de quem é revistado, a cor da pele, a faixa etária, o sexo, o nível de renda e a classe social — até a sentença do juiz e o cumprimento da pena.”
· Justiça – nota sobre o livro no Extra (RJ): Justiça [Extra – RJ – 28/9/2011 pág: 11]
· Justiça – indicação de leitura no jornal O Popular (GO): Biblioteca [O Popular – Goiânia – 11/10/2011 pág: 7]
· Justiça – nota indicando o livro como leitura no Zero Hora (RS): Lançamentos [Zero Hora – Porto Alegre – 8/10/2011 pág: 3]
· Justiça – nota sobre lançamento e noite de autógrafos do livro na seção Cultura do Estado de Minas (BH): 12 – Justiça rima com perdão [Estado de Minas – BH – 23/11/2011 pág: 8]
· Justiça – matéria sobre seu novo livro. Justiça rima com perdão [Divirta-Se / Online – — – ARTE E LIVROS – 23/11/2011]
· Justiça – entrevista com o autor e registro do lançamento do livro na Folha de SP: Ex-traficante sai da cadeia direto para as passarelas [Folha de S. Paulo – SP – 4/9/2011 pág: C4 e C5], reproduzida na Folha.com: Antropólogo defende menos prisão e divisão de responsabilidades [Folha.com / Online – 4/9/2011 pág: Online]
· Justiça – entrevista com o autor na Folha de SP online: 28 – Em livro, antropólogo defende menos prisão
· Justiça – entrevista com o autor no programa Globo News Em Pauta: http://g1.globo.com/videos/globo-news/globo-news-em-pauta/v/luiz-eduardo-soares-fala-de-seu-novo-livro-justica/164810
· Justiça – matéria sobre noite de lançamento do livro e bate-papo com o autor na seção Fornadas do site PQN – O Portal da Comunicação: 9 – Sempre Um Papo recebe Luiz Eduardo Soares [PQN – O Portal da Comunicação / Online – 17/11/2011 pág: Online]
· Justiça – matéria sobre o livro e entrevista com o autor na seção Entrevista da Revista Cult (SP): 13 – Capitão renascimento [Revista Cult – SP – 1/11/2011 pág: 14 a 18]
· Justiça – entrevista sobre o livro para o Globo Blogs: Luiz Eduardo Soares lança livro sobre Justiça brasileira
Elite da Tropa 2
Formato: Livro
Autor: SOARES, LUIZ EDUARDO
Autor: BATISTA, ANDRE
Autor: PIMENTEL, RODRIGO
Autor: FERRAZ, CLAUDIO
Editora: NOVA FRONTEIRA
Assunto: LITERATURA BRASILEIRA
“(…) minha vida tem sido investigar e liquidar o crime organizado sob a face mais cruel: as milícias. Dito assim soa bem? Acho que sim, mas não cauteriza nem preenche o buraco imenso em minha vida pessoal que o destino cavou.Com o anjo da morte na cadeia, mais um passo vai ser dado no rumo certo. Tudo bem. Contudo, outras milícias brotarão Rio afora, hoje, amanhã. A fonte continua ativa. As polícias estão aí, entregues à própria sorte e a um ou outro corregedor destemido, nadando contra a corrente. O esforço, meu, do Fausto, de Aluízio, Marquinho e Tonico, de nossa tribo, vai dar em que lugar? O esforço é generoso, concordo. Mas vai mudar o quê? De que adianta correr atrás do leite derramado, apagar incêndio, reduzir os danos de uma tragédia maior do que nós?”
“Elite da Tropa 2” é uma obra de ficção baseada em fatos atuais sobre o crime organizado no Rio de Janeiro. Escrito pelo antropólogo e cientista político Luiz Eduardo Soares, uma das maiores autoridades em segurança pública no Brasil ao lado de três co-autores que conviveram de perto com a violência na cidade, é a continuação da obra que, lançada em 2006, foi um grande sucesso ao apresentar aos leitores, sob o ponto de vista da polícia, os detalhes das nossas selvagens guerrilhas urbanas. Agora, “Elite da Tropa 2” mostra, por meio de uma narrativa fluída e reveladora, os bastidores das verdadeiras máfias brasileiras: as milícias. São histórias verdadeiras e fictícias cabe ao leitor aplicar os adjetivos a cada episódio e personagem.
Luiz Eduardo Soares
O livro Elite da Tropa 2 é a quarta obra de uma tetralogia à qual dediquei os últimos sete anos de trabalho. A série inclui Cabeça de Porco (escrito com MV Bill e Celso Athayde –Objetiva, 2005), Elite da Tropa (com André Batista e Rodrigo Pimentel –Objetiva, 2006) e Espírito Santo(com Carlos Eduardo Ribeiro Lemos e Rodney Miranda –Objetiva, 2009).
A intenção do Cabeça de Porco era mergulhar no mundo de valores, percepções, sentimentos, relações e práticas dos jovens envolvidos com a violência armada, nas áreas mais vulneráveis de cidades situadas em todas as cinco regiões do país. O propósito era compreender, não julgar, e levar os leitores a compartilhar nossa experiência de interlocução com esses jovens. A expectativa era proporcionar um contato empático com um universo ignorado e distante da maioria dos leitores; um universo humano refratado quase sempre pelo véu de estigmas, preconceitos, ódio e temor. Não tencionávamos fazer a apologia da violência ou sequer justificá-la, mas desvelar suas raízes, plantadas fundas como punhais no corpo e na alma de crianças e adolescentes socialmente invisíveis, devastados pela rejeição e a indiferença, pela fome de afeto e reconhecimento (que pode ser mais dolorosa e devastadora do que a fome física), por estigmas, racismo, desigualdades monstruosas e as iniquidades naturalizadas.
A intenção do primeiro Elite da Tropa era a mesma, mas aplicada aos supostos inimigos daqueles jovens focalizados no Cabeça: os policiais. Quem são esses personagens que vestem uniforme, recebem salários, armas e instrução do Estado, e caçam traficantes nos morros, nas vilas, favelas e periferias, como feitores de um escravismo extinto? Quem são esses policiais que, em nome da Lei, a transgridem sem pudor e piedade, matando seus irmãos de classe numa insensata “falsa-guerra” fratricida? No Rio de Janeiro, por exemplo, os números descrevem um genocídio de jovens pobres, na maioria negros: entre 2003 e 2009, inclusive, 7.854 foram mortos por ações policiais. A categoria oficial, “autos-de-resistência”, omite o fato de que, segundo estimativas apoiadas em pesquisas sobre os dados de 2003, cerca de 65% dos aludidos confrontos confrontam apenas a verdade, pois se referem, na realidade, a execuções extra-judiciais. Seriam os policiais indivíduos sádicos, pervertidos, assassinos contumazes por prazer e vocação? Nesse caso, como explicar a escala assombrosa alcançada pela brutalidade individual dos policiais e a manutenção de tamanha regularidade, ao longo do tempo, configura um padrão e apresentando o perfil de uma … política? Ao mergulhar no universo de emoções, valores, visões de mundo e experiências dos policiais, procuramos compartilhar com os leitores algumas surpresas para quem só opera com estereótipos: lá estão seres humanos como quaisquer de nós, que chegam muito jovens para o processo de formação e cedo aprendem o que depois aplicarão. São cidadãos trabalhadores, oriundos principalmente das classes populares, que cumprem ordens, acreditando, ao fazê-lo, estar honrando seu país, sua instituição e os valores que foram levados a cultuar. Muitos se perdem na corrupção mais degradante; outros, submetidos a treinamentos que emulam a “lavagem cerebral”, convertem-se em máquinas de matar e torturar, confundindo heroísmo com brutalidade letal contra suspeitos e patriotismo com violação dos direitos mais elementares dos segmentos sociais estigmatizados. Nesse contexto, propusemos aos leitores uma pergunta: o problema é individual? Os policiais, individualmente, são “inimigos do povo”? A responsabilidade se esgota neles, enquanto indivíduos? A questão se resume a “desvios de conduta”, como sugerem as declarações oficiais? Ou se trata de um consistente e permanente programa institucional, alicerçado em uma cultura corporativa anti-democrática (refratária aos direitos humanos e aos mandamentos constitucionais) e alimentado por decisões criminosas de autoridades e governantes? Ademais, acrescentamos: esse mecanismo de horror e morte, envolto nas máscaras da segurança pública, não poderia se sustentar sem que a venda da Justiça a cegasse para a barbárie em curso. Todavia, tampouco a Justiça poderia manter-se alheia, se a maioria da sociedade não se omitisse, adotando postura hipócrita e cúmplice.
Tais conclusões conduziram ao terceiro livro, Espírito Santo, cujo foco é o crime organizado plantado no próprio judiciário e infiltrado nas instituições políticas e policiais. O assassinato do jovem, brilhante, honrado e corajoso juiz, Alexandre Martins de Castro Filho, em 2003, é o ponto de partida da narrativa que explora o labirinto das investigações até o desvendamento da trama covarde. Indivíduos têm responsabilidade. Não devemos ser paternalistas ou tapar o sol com a peneira. Mas se não houver espaços políticos e brechas institucionais, apoios coletivos e conexões com interesses maiores, não explicamos a cadeia dos episódios. Mesmo as paixões têm lastros numa realidade mais ampla que as canalizam em determinadas direções e limitam suas possibilidades de expressão criminosa. Por isso, é o Judiciário que está em tela de juízo, não os indivíduos, isoladamente.
Por fim, chegamos ao livro que acaba de ser publicado, Elite da Tropa 2 (em parceria com Cláudio Ferraz, A. Batista e R. Pimentel –Nova Fronteira, 2010). Nessa obra, as principais intenções são as seguintes: (1) chamar a atenção para as milícias e mostrar como elas funcionam e como tiranizam comunidades vulneráveis de modo selvagem. Elas são máfias formadas sobretudo por policiais e constituem as formas mais graves do crime organizado, no Brasil, ligando, organicamente, corrupção e brutalidade policiais às instituições políticas e a outras instituições públicas. (2) Ao contar a história das milícias, procuramos demonstrar que, no Rio, não há mais espaço para falar em corrupção e brutalidade policial como problemas menores, secundários, circunstanciais. Nem é mais legítimo falar em crime e violência, no Rio (mas o ovo da serpente está disseminado, ainda que variações regionais sejam significativas), sem admitir que numerosos contingentes policiais são os mais destacados e poderosos empreendedores das dinâmicas criminosas. Foi-se o tempo em que policiais eram cúmplices por omissão ou mesmo por sociedade passiva. Hoje, no Rio de Janeiro, eles são os principais protagonistas das formas mais perversas e perigosas da criminalidade. Ressalve-se, entretanto, que não generalizamos. Seria absolutamente injusto com dezenas de milhares de profissionais honestos, que arriscam sua vida por salários indignos. Eles são vítimas desse processo: sofrem os efeitos da degradação institucional; pagam o preço da deteriorada imagem pública; sentem-se acuados, humilhados e traídos pela presença arrogante e crescente dos falsos colegas. (3) Ao incluir na trama um militante dos direitos humanos que se elege deputado e luta contra as milícias com desassombro, imensa generosidade e admirável dignidade, prestamos uma homenagem a Marcelo Freixo (deputado estadual pelo PSOL), mas também mostramos que nem tudo está perdido na política e nas polícias (pois há alguns personagens policiais também muito positivos). Um personagem literário não é uma pessoa real. A ficcionalização que transforma Marcelo Freixo em “Marcelo Freitas” mesclou características reais de Freixo com outras, inspiradas em outras pessoas, e as combinou com alguns elementos imaginários, para permitir sínteses e mergulhos na subjetividade que exigem liberdade criativa. Mas a homenagem é verdadeira e a defesa da política nobre e virtuosa se realizou. (4) A obra procura, ainda, trabalhar em profundidade dilemas éticos, demonstrando não haver cartilhas, dogmas ou gramáticas capazes de abarcar a exuberante e subversiva produtividade do real, que nos desafia continuamente com dilemas inesperados e de imensa complexidade, exigindo da consciência ética a mesma ousadia e fecundidade que se requer da criação estética. E como, para mim, não há política virtuosa, digna, justa, boa ou correta, dissociada da ética, acredito que, tendo discutido questões éticas pela mediação dos dramas vividos pelos personagens, o livro Elite da Tropa 2, também por esse viés, contribui para o debate político.
Antes de concluir, um alerta: as milícias são filhas bastardas da segurança privada informal e ilegal. Na medida em que esta está presente em todo o país, a matriz genética das máfias policiais já se nacionalizou. Explico: com raríssimas exceções, os salários da massa policial são insuficientes, no Brasil –para dizer o mínimo e manter-me fiel a um vocabulário educado. Para sobreviver e garantir a reprodução de sua unidade doméstica, os trabalhadores policiais, em sua maioria, buscam uma segunda ocupação, um “bico”. Vão desempenhá-lo, quase sempre, como é natural, na área de sua especialidade: a segurança. Ocorre que, em quase todo o país –e por boas razões–, é ilegal o servidor da segurança pública vincular-se à segurança privada. Posto não ser permitido fazê-lo formalmente, engaja-se, então, o policial, no setor informal da segurança privada ou nela atua, informalmente. Os malefícios para sua saúde, para seu desempenho na segurança pública e os riscos à sua própria vida são evidentes –as mortes de policiais concentram-se na “folga”. Apesar de tudo isso ser amplamente conhecido, as autoridades fingem nada ver. Não fiscalizam. Não tomam qualquer providência. Afinal, sabem que se fiscalizarem a segurança privada informal, encontrarão seus policiais fazendo o “bico”. E também sabem que se reprimirem essa ilegalidade, a demanda salarial se projetará sobre o governo, provocando o colapso do orçamento –que é, vale repetir, irreal. A Polícia Federal é responsável por essa fiscalização, mas com 14.500 funcionários e uma infinidade de atribuições não teria como realizá-la (mesmo se o desejasse, o que, por óbvio, não é o caso). Os governos estaduais poderiam reivindicar essa atribuição, mediante convênio –como foi feito no passado, por pouco tempo. Mas não têm o menor interesse em meter a mão no vespeiro, optando por preservar o gato-orçamentário, isto é, o financiamento privado (informal e ilegal) da segurança pública. Eis, portanto, o Estado despudoradamente partido: um pé na legalidade, outro na ilegalidade.
O problema maior (há vários outros muito sérios) é este: sob o manto da negligência oficial, prosperam dinâmicas benignas e malignas. As primeiras, a despeito dos males que causam (os já referidos e outros), representam esforços honestos (ainda que ilegais) de homens e mulheres policiais que apenas lutam para completar sua renda. As dinâmicas malignas começam nas ações de policiais corruptos que provocam insegurança para vender segurança; prosseguem na formação de esquadrões da morte e grupos de extermínio; e alcançam o patamar superior de degradação e gravidade quando deságuam na organização de milícias.
Por isso, o livro Elite da Tropa 2 lança este alerta à sociedade: ainda que só o Rio conheça as manifestações mais articuladas e perigosas das milícias, o ovo da serpente já se espalhou pelo país. Até quando os governos continuarão deitados em berço esplêndido, se ufanando do crescimento econômico, alheios ao veneno que avança na retaguarda do Estado, alimentado pelo gato orçamentário e suas implicações?