Entrevista Revista Época
1) Como o senhor avalia a segurança pública no futuro governo Dilma Rousseff?
Na ausência de reformas institucionais, temo que nos arrastemos por mais quatro anos insistindo em fazer mais do mesmo, adiando a tarefa histórica de estender à segurança o processo da transição democrática e modernizante, que marcou o país nas últimas décadas.
Por outro lado, tenho esperança de que os avanços conquistados por Tarso Genro e Balestreri não se percam. A Renaesp e o Pronasci têm sido importantes por valorizarem a educação policial e a participação dos municípios na segurança, via políticas preventivas. Espero que o novo ministro mantenha e expanda ambos os programas. Mas gostaria que ele reconhecesse que esses esforços não podem substituir as inadiáveis reformas institucionais. Todavia, há muito a fazer enquanto as reformas não vêm. O melhor caminho seria retomar o plano de normatização do Susp, sistema único de segurança público, que define parâmetros nacionais de qualidade para as áreas chave das instituições da segurança pública, como a formação, a gestão do conhecimento, a gestão institucional, a perícia e o controle externo.
2) O que o senhor pensa do perfil escolhido para comandar o Ministério da Justiça? Eduardo Cardozo é um político, mas com conhecimento técnico. (O ex-ministro Tarso Genro, em entrevista ao Estadão, falou que será um trabalho de continuação e superação)
Resposta: Não conheço o novo ministro. Ele tem a imagem de um político que fez escolhas difíceis e justas, contra conveniências e cumplicidades, em momentos críticos. Arriscou a carreira por convicções, o que está fora de moda. Por que não poderia surpreender, fazendo, agora, a coisa certa, metendo a mão em vespeiros mesmo sob risco do desgaste político? No ministério da Justiça, há dois destinos: equilibrar-se no cargo para merecer a foto na aristocrática sala de retratos, onde se conta a história do país, ou fazê-la. Por que não confiar na melhor hipótese?
3) Qual deve ser a prioridade do próximo governo? É realmente dar continuidade ao Pronasci?
Resposta: O Pronasci merece ser mantido e fortalecido, porque estimula iniciativas preventivas e municipais, mas está longe de corresponder a uma política nacional de segurança. Seria preciso ir além, tratando das reformas já mencionadas, que deveriam vir associadas à normatização do Susp.
4) Ficou claro para o senhor qual foi a prioridade do atual governo Lula?
Resposta: A prioridade, no primeiro mandato, foi substituir, por ações espetaculares e midiáticas da polícia federal, a promessa de uma audaciosa reforma institucional, destacada no plano nacional de segurança pública que o presidente Lula apresentou ao país, em fevereiro de 2002, antes mesmo de oficializar sua candidatura. No segundo mandato, as iniciativas foram muito mais consistentes e as prioridades, mais positivas: o investimento na educação policial (Renaesp), liderado pelo secretário nacional, Ricardo Balestreri, e a aposta em ações locais preventivas, conduzida pelo ministro Tarso Genro. Por isso, o segundo mandato registrou avanços significativos, ainda que, mais uma vez, ao custo do sacrifício das reformas institucionais, cujo preço político evitou-se pagar.