A história do mineiro esperto
Facebook, 2 de junho, 2020
A história do mineiro esperto
Eu morava nos Estados Unidos, fazia pós-doutorado e frequentava, quando podia, um restaurante brasileiro. Estávamos em meados dos anos 90. O dono era um mineiro muito simpático. Conversávamos sobre futebol e a saudade de nossa terra. Sem internet, a saudade era grande. Para minha inveja, ele tinha uma antena especial em casa que lhe permitia ver, em tempo real, alguns jogos do Brasil. Como se aproximava a decisão do campeonato carioca que meu time disputaria, combinei com meu novo amigo que assistiríamos juntos. Uma semana antes, a ansiedade crescia e eu o procurei para acertar os detalhes. Deu-se, então, mais ou menos, o seguinte diálogo. – E aí, tudo certo pra final? Prometo levar as cervejas. – Pô, cara, não vai dar. – Sério? Não diz isso. O que aconteceu? – Cancelei o serviço de transmissão internacional. – Por que? Aumentou o preço? – Não. Descobri que a TV do vizinho estava pegando as transmissões que chegavam à minha casa. – E você perdia o sinal? Ele roubava o sinal? – Não, eu via tudo, normalmente. – Então, qual o problema? – O problema é que eu via, pagando, e o espertinho via de graça. – E daí? – E daí que ninguém vai se aproveitar de mim. Não sou trouxa. Parece uma parábola ou uma piada, mas juro a vocês que é verdade. Pois saibam que hoje, no país, tem muita gente boa que não assina um manifesto que defenda a formação de uma frente ampla pela democracia para não beneficiar os adversários que já assinaram e que, pela simples vizinhança na mesma lista de signatários, seriam redimidos dos imperdoáveis pecados do passado. Mesmo que o incêndio comece a queimar a casa e nós precisemos da soma de forças para derrubar a parede. Mesmo que o ar comece a nos faltar.