Bolsonaro anunciou o golpe ao mundo, deveria ser deposto e preso
Luiz Eduardo Soares reage à reunião de Bolsonaro com embaixadores e defende mobilização da sociedade contra tentativa de golpe
por Ivan Longo
O antropólogo e cientista político Luiz Eduardo Soares, em texto que viralizou nas redes sociais na segunda-feira (18), considera que a reunião de Jair Bolsonaro (PL) com embaixadores estrangeiros configura um anúncio de golpe ao mundo. Na apresentação a representantes diplomáticos, o presidente repetiu teorias conspiratórias, já desmentidas, sobre fraude nas urnas, atacou ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e fez declarações golpistas no sentido de ameaçar a realização das eleições deste ano. “O golpe foi anunciado, hoje, oficialmente, e para o mundo. A situação nunca foi tão grave. Nos EUA, Trump anunciou, antecipadamente, que não aceitaria o resultado das eleições (se perdesse). Bolsonaro acaba de declarar que, se a legislação eleitoral em vigor for mantida, não haverá eleições. Falou na primeira pessoa do plural, se referindo às Forças Armadas. Essa declaração de guerra ao TSE e à Lei, à Constituição, ocorreu dentro do Palácio, com transmissão oficial ao vivo, diante dos Embaixadores convocados”, avalia Soares. Segundo o antropólogo, “Bolsonaro teria deser deposto e preso”. “Isso não vai acontecer, o que demonstra que nós já não vivemos sob o Estado democrático de direito. Se a sociedade estivesse mobilizada e plenamente consciente do que está acontecendo, amanhã haveria greve geral e milhões de pessoas tomariam as ruas de todo o país. Não é o caso, desafortunadamente”, lamenta. “Então, só nos resta mobilizar o que for possível, reunir a oposição e as organizações da sociedade civil. Todas elas. As universidades têm de parar. Quem puder parar, tem de parar. Agora. Nem mais um passo atrás ou o triunfo do golpe, já iminente, será certo e irreversível”, finaliza.
Oposição reage
A oposição ao governo Bolsonaro no Congresso Nacional vai entrar com ações em tribunais contra o presidente por conta das mentiras disseminadas sobre o sistema eleitoral brasileiro em reunião com embaixadores estrangeiros na segunda-feira (18). O senador Randolfe Rodrigues (RedeAP) é um dos parlamentares que anunciou representação contra Bolsonaro. Um dos coordenadores da pré-campanha de Lula (PT) à presidência, Randolfe anunciou que encaminhará representação ao TSE apontando propaganda eleitoral irregular de Bolsonaro e solicitando a condenação do PL, legenda do presidente, para que se faça uma errata desmentindo “os termos das declarações do seu candidato em TVs públicas”. “Além disso, vamos pedir a Condenação do PL a perder o tempo de sua propaganda eleitoral equivalente ao gasto pelo pré-candidato na divulgação de ataques e informações inverídicas sobre as urnas eletrônicas! Chega de deixar Bolsonaro esculhambar a nossa democracia!”, escreveu ainda o senador. O líder da Minoria na Câmara dos Deputados, Alencar Santana Braga (PT-SP), por sua vez, anunciou que os partidos de oposição denunciarão Bolsonaro por desacreditar o sistema eleitoral e ainda utilizar uma TV pública para divulgar as mentiras. Fórum apurou que a representação deve ser encaminhada ao STF.
Bolsonaro inelegível?
Ao utilizar a TV Brasil, uma emissora pública, para disseminar informações falsas sobre o sistema eleitoral brasileiro, durante reunião com embaixadores estrangeiros, o presidente Jair Bolsonaro (PL) comete crime eleitoral e pode vir a ser cassado, caso se reeleja, ou mesmo ficar inelegível. A avaliação é de Renato Ribeiro de Almeida, advogado especializado em direito eleitoral. À Fórum, Almeida explicou que a atitude de Bolsonaro em colocar em xeque a confiabilidade das urnas eletrônicas, atacar ministros do STF e TSE e seu principal adversário, o ex-presidente Lula (PT), em reunião com embaixadores transmitida por um meio de comunicação social, se assemelha ao caso do ex-deputado estadual Fernando Francischini, que teve seu mandato cassado por disseminar os mesmos tipos de mentiras através das redes sociais. “Há a possibilidade de abuso dos meios de comunicação social. Se assemelha ao caso do Francischini, que foi cassado pela Justiça Eleitoral e perdeu o mandato devido a condutas de disseminação de fake news por meio das redes sociais”, diz o advogado. Segundo Almeida, há um “agravante” no caso de Bolsonaro, pois “se trata de uma TV pública, portanto de recursos públicos, que foram utilizados para disseminar mentiras, ataques aos adversários, especialmente Lula, sistema eleitoral, ministros, promovendo, especialmente diante de embaixadores, fake news e promovendo a desordem no país”. “Temos uma situação que, por mais inusitada que seja, pode gerar consequências, inclusive cassação do eventual segundo mandato e também inelegibilidade por 8 anos”, atesta o advogado.
Mentiras
Na reunião com embaixadores estrangeiros, foi exibida uma apresentação de Power Point com teorias conspiratórias, já desmentidas em inúmeras ocasiões, sobre suposta fraude nas urnas eletrônicas. Entre as mentiras contadas por Bolsonaro, está, por exemplo, a de que as urnas não são auditáveis. Outra mentira proferida pelo presidente é sobre o inquérito da Polícia Federal, autorizado pelo STF, sobre suposto ataque hacker às urnas eletrônicas em 2018. O TSE, no entanto, já informou que, na apuração, foi concluído que não houve qualquer tipo de fraude ou alteração nos resultados. Mesmo assim, Bolsonaro trouxe o assunto novamente à tona e defendeu que as eleições municipais de 2020 não tivessem sido realizadas. “Até hoje esse inquérito não foi concluído. Entendo que não poderia ter as eleições de 2020 sem apuração”, disparou. Bolsonaro resgatou inúmeras mentiras que vem contando sobre o sistema eleitoral há mais de um ano, sem apresentar qualquer tipo de prova. Ele citou, por exemplo, vídeos que mostram eleitores tentando digitar “17” na urna, em 2018, e o equipamento mostrando que essa seria uma opção de voto inválida. Acontece que, nesses vídeos, os eleitores digitam o número eleitoral na etapa em que deveriam digitar o número do candidato a governador, e não a presidente. Em meio às mentiras sobre o sistema eleitoral, Bolsonaro aproveitou a reunião com embaixadores, ainda, para atacar ministros do STF e TSE. Ele afirmou, por exemplo, que o ministro Edson Fachin é advogado do MST, informação já desmentida em inúmeras ocasiões, se referindo ao movimento como um grupo “terrorista”, e que o magistrado “soltou Lula” – o que também é mentira, já que a revogação da prisão do ex-presidente foi uma decisão tomada pelo plenário do STF. Os ministros do STF Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Luis Roberto Barros “Fachin, Moraes e Barroso. São três pessoas apenas. Três pessoas que trazem instabilidade para o nosso país. Fachin tornou Lula elegível e agora preside o TSE. Moraes advogou para bandidos no passado e Barroso defendeu o terrorista italiano”, declarou. O presidente, em dado momento de seu discurso golpista, ironizou a presença de observadores internacionais no Brasil para acompanhar as eleições. “Eu peço aos senhores, o que essas pessoas vêm fazer no Brasil? Vêm observar o quê? Que o voto é totalmente informatizado? Vêm dar ares de legalidade?”, questionou. Toda a transmissão da reunião usada para desacreditar o sistema eleitoral brasileiro e atacar ministros do STF e TSE foi transmitida pela TV Brasil, uma emissora pública.