Resposta a um amigo
Querido Tony Piccolo, como você sabe, e sente, nossa amizade está acima dessas divergências e eu
só lhe posso agradecer a sinceridade, que é a melhor forma de respeitar o diálogo e o interlocutor.
Tenho sido, como você sabe, um crítico do PT ao longo de muitos, muitos anos. E é claro que setores
do PT (falo assim para não generalizar e cometer injustiças) se envolveram no que há de pior na
política brasileira. Entretanto, o que se montou no Brasil é uma farsa grotesca, seguida de violações
inaceitáveis aos direitos individuais. Primeiro, tirar Dilma, entoando nas ruas palavras de ordem anti-
corrupção… para entregar, via Eduardo Cunha, o poder ao comitê central do crime organizado… E isso
não significa aprovação do governo Dilma, de jeito nenhum, mas o artifício utilizado e os fins visados
foram indignos de classificação. Em paralelo, seguiram-se esforços importantes e respeitáveis do MP e
da Justiça contra a corrupção, até que a dinâmica se revelou desigual, seletiva -e esta não é uma
impressão, falo com conhecimento do que se passou. Começou o festival de violações, desde as mais
comezinhas, e tudo era justificado, na mídia, em nome do fim maior, a luta contra a corrupção.
Gravaram uma presidente da República, fora do período autorizado, e vazaram. Os vazamentos, ah! os
vazamentos… Siga a trilha dos vazamentos e você verá a mão invisível da orientação política. Por fim,
levaram o reitor da UFSC ao suicídio. Participei de uma cerimônia em homenagem à sua memória e
ouvi o relato minucioso. Foi simplesmente torpe o que fizeram a PF, o MP e a Justiça. Depois, as
conduções coercitivas na UFMG (tudo começou com a injustificável, legalmente, condução coercitiva
de Lula, há quase dois anos). Violações passaram a ser o dia a dia das operações. Como sempre se
deu, aliás, no tratamento de outras classes sociais. Até que se chega ao julgamento do Lula. Meu
querido amigo Tony Piccolo, a condenação foi bizarra, como será a confirmação em tempo recorde, em
Porto Alegre. Eu não desejaria isso a um inimigo, não apoiaria se fizessem isso com um político liberal
ou conservador. Nem com Bolsonaro, eu aceitaria que cometessem as arbitrariedades que, todavia, ele
quer praticar contra os outros… Mas, enfim, não defendo o Lula porque sou de esquerda, e eu sou,
claro, como demonstra toda a minha história, mas defendo Lula como um liberal deveria fazer, em
nome de princípios e garantias que deveriam ser o norte de um Estado democrático de direito. Se
querem um bode expiatório, escolheram errado. Vão produzir um mártir, e eu estarei ao lado do mártir
ao longo do calvário, em nome, repito, de princípios que FHC deveria defender. Há muita
pusilanimidade, meu amigo, muita covardia e indignidade, muita hipocrisia. Grande abraço